Realidade de povos de terreiros é debatida com órgãos nacionais e internacionais

“Esse é um momento histórico. É a primeira vez que um organismo internacional como a Organização Internacional do Trabalho vem a uma comunidade de terreiro para ouvir as demandas dessas pessoas.”

A afirmação da subprocuradora geral do trabalho Edelamare Melo resumiu a importância do encontro de povos tradicionais de terreiros de candomblé com representantes de organismos como Organização Internacional do Trabalho, Ministérios Público do Trabalho e Federal, Justiça do Trabalho e Governo do Estado. A culminância da primeira fase do projeto Àwúre foi realizada na manhã desta terça-feira (26/03), na Casa de Oxumarê, no bairro da Federação, em Salvador, reunindo mais de 70 líderes de terreiros de todo o estado.

As atividades iniciadas no fim de semana foram compostas por uma série de oficinas em que jovens de diversas comunidades de terreiros de Salvador e do interior do estado, além de lideranças dessas casas se reuniram para debater e elaborar um documento com os principais anseios e demandas dessa parcela da sociedade. O texto final foi apresentado nesta terça-feira para a diretora-geral adjunta da OIT, Celeste Drake, que está em visita oficial ao Brasil. O documento servirá de base para a proposição de políticas públicas que possam enfrentar a questão do racismo, da intolerância religiosa e do acesso a oportunidades iguais.

A número dois do braço das Nações Unidas para a promoção de relações de trabalho dignas destacou o significado de tudo o que ouviu durante o evento e fez questão de ressaltar a relevância da busca constante pela garantia de direitos. “Nada deve existir sem que haja justiça social. Esse é um pilar presente na constituição da OIT. Por isso, é tão importante essa escuta”, afirmou. O diretor do Escritório da OIT para o Brasil, Vinícius Carvalho Pinheiro, também enalteceu a riqueza dos depoimentos apresentados pelos jovens participantes das oficinas. “Esse é um projeto muito inovador do qual nos orgulhamos de fazer parte”, pontuou.

O babalorixá Pecê (peșe, na grafia original em iorubá) líder religioso da Casa de Oxumarê, que abrigou o evento, falou do impacto da discriminação na vida dos povos de terreiros. “O Àwúre existe para a gente tentar buscar ações, políticas públicas para os excluídos, os invisibilizados, combatendo discriminação no trabalho e na vida como um todo”, destacou. Já para a secretária de Promoção da Igualdade racial do Estado, Ângela Guimarães, “os povos de terreiros têm sido as principais vítimas de uma série de violações, tanto do ponto de vista da perda de direitos, fragilizando a sua relação com o mundo do trabalho de forma mais ampla, como também no ataque a sua própria existência”, pontuou.

Para fazer frente à realidade de discriminação, o projeto busca fortalecer a escuta dessas comunidades. Ouvir e levar em consideração o que essas populações têm a dizer é, segundo o procurador Marcos André, do MPF, fundamental para a garantia de direitos fundamentais. “Aqui, a gente pode ouvir as demandas, pode ver as dificuldades que eles estão passando e pode apresentar o nosso trabalho e o que a gente pode fazer para ajudar. Por isso é fundamental criar e fortalecer esse canal com os povos tradicionais, aqui especificamente os povos de terreiros, com o Ministério Público”, afirmou.

Para a vice-presidente do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia, desembargadora Léa Nunes, “a Justiça como um todo preza pelo respeito à dignidade e à diversidade. Nós temos cada vez mais a consciência de que devemos respeitar a cultura do trabalhador e do empregador, a sua religião, a sua forma de ser.” Um dos participantes das oficinas, Evanilson Alves, destaca “a importância desse projeto para potencializar muito do que a gente já traz das nossas vivências enquanto jovens pretos e pretas periféricos, uma vez que para a gente é dez, vinte vezes mais complicado chegar. É possível chegar, é possível ocupar espaços elitizados e mostrando a nossa cara.”

Também prestigiaram o evento o procurador e representante do MPT na Agenda Bahia do Trabalho Decente, André Pessoa, o coordenador da Agenda, Álvaro Gomes, o superintendente da Fundação José Silveira, parceira na execução do projeto, Carlos Dumet, a juíza aposentada e coordenadora do programa Trabalho Seguro do TRT5, Rosemeire Fernandes, e o procurador Antônio de Pádua, dentre outras autoridades.

A Casa de Oxumarê ficou lotada durante o evento
A Casa de Oxumarê ficou lotada durante o evento

a diretora adjunta da OIT, Celeste Drake, destacou a importância de ouvir a comunidade de terreiros
a diretora adjunta da OIT, Celeste Drake, destacou a importância de ouvir a comunidade de terreiros

A subprocuradora geral do trabalho Edelamare Melo coordenou as atividades
A subprocuradora geral do trabalho Edelamare Melo coordenou as atividades

 

Imprimir