MPT alerta para risco de manter gestão terceirizada de presídios na Bahia
“A terceirização da função de agente penitenciário está diretamente relacionada com a atual crise no sistema penitenciário no Brasil”. A afirmação é da procuradora do trabalho Séfora Char, uma das autoras de uma ação que o Ministério Público do Trabalho (MPT) na Bahia move contra o governo do estado por essa prática.
A ação chegou a ter liminar deferida, mas a presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT5), desembargadora Adna Aguiar, suspendeu os efeitos da decisão e até o momento não colocou o assunto em pauta para deliberação dos desembargadores.
Segundo Séfora, o estado ingressou com uma medida polêmica contra a decisão da 5ª Vara do Trabalho, diretamente com a presidente do Tribunal, que suspendeu a vigência da liminar. Ainda assim, a procuradora acredita que a liminar pode voltar a valer em breve. “Estamos muito confiantes que isso vai ser revisto, pela própria presidente do Tribunal, que tem um histórico de comprometimento com os trabalhadores e uma sensibilidade social muito forte, como também temos plena confiança de que o órgão especial vai rever esse posicionamento assim que o assunto entrar em pauta”, avaliou.
Ela e outros dois procuradores pedem, na ação civil pública, o fim da terceirização da atividade dos agentes penitenciários em todos os presídios baianos. A liminar concedida havia determinado que o governo deixasse de fazer novos contratos de terceirização da gestão de penitenciárias. “Essa é uma liminar bastante razoável, porque ela (a juíza) não decretou imediatamente a rescisão dos contratos com as empresas terceirizadas. Ela determinou apenas que não fossem renovados, nem realizados novos contratos. Então ela não comprometeu a ordem pública”, afirmou a procuradora.
Dano moral coletivo – Séfora Char chamou a atenção para o fato de que o próprio Ministério da Justiça, tinha feito uma inspeção em que chegou à conclusão de que a terceirização foi um dos vetores fundamentais para o fortalecimento das facções criminosas dentro das unidades. “O próprio ministro Alexandre de Moraes, foi bem enfático em relação a isso”, pontuou. Segundo a procuradora, além do pedido de que não sejam realizados novos contratos e licitações para terceirização do cargo público de agente penitenciário, é pedida também uma indenização por dano moral coletivo e que o estado não se utilize de mão da obra diversa do concursado.
“A terceirização do cargo de agente penitenciário é ilícita. É um cargo público previsto em lei, logo a administração pública não pode terceirizar. Agentes penitenciários devem ter uma função de segurança pública”, afirmou. Para ela, delegar uma atividade, que por lei é indelegável, ao setor privado, deixa a sociedade mais vulnerável. “A empresa terceirizada tem informações de inteligência de segurança pública. Ela está tendo acesso a informações secretas, para depois poder até quarterizar esse serviço, o que deixa a situação bem mais vulnerável”.
Concurso público – Para a procuradora, a terceirização dos agentes penitenciários prejudica aqueles que fizeram o concurso público e que o estado deixou expirar, à medida que foi terceirizando. “Chegou ao ponto de pessoas que passaram no concurso público estarem ganhando um terço como terceirizadas. E pessoas que apresentamos na ação, uma relação enorme, que foram reprovados no concurso público e estavam exercendo a função de agente penitenciário privado”, revelou.
“Qual o grau de comprometimento que o agente privado, chamado de agente disciplinar, vai ter com o serviço público, quando estiver no aviso prévio?”, perguntou a procuradora. “Isso não pode acontecer porque é uma função prevista em lei. Para terceirizar um cargo público, primeiro a administração pública deve extinguir aquele cargo, sendo que isso também não seria possível, porque o estado não pode delegar para terceiros, passar para a iniciativa privada, uma atividade de segurança pública”, respondeu.
De acordo com a procuradora, a Bahia adota o modelo de cogestão. Existem unidades penitenciárias, que eles chamam unidades sob gestão plena, onde existem agentes penitenciários concursados. Mas estão se proliferando unidades penitenciárias terceirizadas, ou seja, o estado da Bahia convoca o diretor, o diretor adjunto e o coordenador de segurança, que são servidores públicos, e todo o resto do efetivo é terceirizado. O MPT acredita que quando você terceiriza, você vulnerabiliza esse trabalhador, ou seja, você precariza aquela mão de obra e nesse caso, ao mesmo tempo, por envolver segurança pública, você deixa a sociedade também numa situação mais vulnerável.
Alerta ao estado – Estudo publicado pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, órgão interno do Ministério da Justiça, aponta a terceirização da gestão das unidades como fator essencial para o massacre de Manaus ter acontecido. “Precisamos estar atentos para que isso não aconteça na Bahia, como já vem ocorrendo em outros estados onde a ausência do Estado nas unidades prisionais tem facilitado a tomada desses espaços pelos próprios detentos”, alertou Séfora Char.
“Na Bahia, temos várias ações em relação à ilicitude da terceirização das atividades fins de empresas públicas. A Embasa – Empresa Baiana de Águas e Saneamento, é um exemplo. Tivemos recentemente uma vitória por inteiro nessa ação e fechamos um acordo. Através do procurador Ilan Fonseca, ajuizamos uma ação em relação à Caixa Econômica Federal que terceiriza sua atividade finalística. Enfim, muitas dessas entidades públicas utilizam a mão de obra com promiscuidade, justamente o que combatemos”, enumera a procuradora.
ACP-0000331-45.2016.5.05.0005