Jornalista diz que cadeias produtivas estão por trás do trabalho escravo

O jornalista Marques Casara defendeu na noite desta segunda-feira que crimes de grandes proporções contra a dignidade humana e o meio ambiente exigem uma cobertura mais profunda e duradoura.

Para ele, o jornalismo, nesses casos, deve ser baseado em minuciosa investigação e apoiado por uma rede de veiculadores e organismos que atuam para pressionar os grandes grupos econômicos. O objetivo é o de força-los a agir em suas cadeias produtivas para eliminar toda forma de trabalho escravo, devastação ambiental, crimes que ferem a dignidade humana. As afirmações foram feitas durante palestra na sede do Ministério Público do Trabalho (MPT), em Salvador na noite desta segunda-feira (30/11). Ele foi o palestrante do evento organizado pela Comissão de Erradicação do Trabalho Escravo do Estado da Bahia (Coetrae) para jornalistas com o objetivo de oferecer capacitação para tratar do trabalho análogo ao de escravo.

Casara contou a história de um matemático grego que foi chamado a uma vila insular que tinha sete pontes determinado a solucionar um antigo (já naquela época) mito de que era impossível cruzar as sete pontes sem passar por pelo menos uma delas mais de uma vez. A solução foi apresentada, já que de fato era impossível: construir uma oitava ponte. Para Marques Casara, o fato de não enxergarmos um caminho não significa que ele não exista, pensamento que ele pinçou de Nietsche. “A missão do jornalista é encontrar esse caminho, mesmo que ele não esteja visível, é construir essa oitava ponte”, asseverou.

Casara mostrou que na cobertura cotidiana de casos de combate ao trabalho escravo no Brasil, notadamente, as operações de resgate ou fiscalização, está muito restrita a apenas um aspecto da questão. “Quando encontramos pessoas trabalhando em condições análogas à escravidão existe alguém por trás disso e normalmente esse alguém é uma grande corporação. Só mostrando a relação dessas grandes marcas com o problema vamos de fato combater o trabalho escravo”, asseverou. Ele relatou uma série de reportagens que realizou em que a exposição da cadeia produtiva levou a mudanças na política de grandes empresas e na solução do problema em sua ponta. Citou casos da indústria têxtil no interior paulista, que serve a grandes marcas de roupas e o caso de uma pequena carvoaria no interior do Pará que servia à cadeia produtiva de uma gigante mundial do aço.

A dificuldade em veicular e principalmente produzir reportagens elaboradas, detalhadas através do que chamou de veículos de comunicação industriais também foi abordada. “É evidente que a imprensa tradicional não dispõe mais de condições de destacar um repórter para trabalhar por seis meses em uma reportagem e também que ela não tem interesse em desvendar as relações das grandes marcas, que são seus principais anunciantes, com questões como trabalho escravo e devastação ambiental. Por isso, cabe ao jornalista encontrar meios de fazer esse tipo de reportagem e veiculá-la”, declarou. Ele explica que nos casos que citou, em que reportagens ajudaram a mudar a postura de grandes grupos econômicos, além da veiculação da matéria em canais alternativos e em grandes veículos, houve também pressão institucional e muita insistência em redistribuir os dados da reportagem para novas matérias.

A Oficina Temática para Jornalistas sobre Trabalho Escravo contou ainda com palestras de Admar Júnior e Jessevanda Galvino. Os dois atuam no governo do estado da Bahia e integram a Coetrae e fizeram relatos de recentes operações envolvendo denúncias de trabalho escravo na Bahia e no Programa Ação Integrada, aposta do estado para enfrentar a dificuldade de manter as pessoas resgatadas em operação de combate ao trabalho escravo livres de novos aliciamentos, garantindo apoio para reinserção social e para capacitação e recolocação no mercado de trabalho. O evento contou ainda com a presença do procurador-chefe do MPT na Bahia, Alberto Balazeiro, do coordenador estadual de Combate ao Trabalho Escravo do MPT na Bahia, Ilan Fonseca, do oficial de projetos da Organização Internacional do Trabalho (OIT) Antônio Carlos de Mello e do secretário de Trabalho, Emprego, Renda e Esporte da Bahia, Álvaro Gomes.

Tags: Trabalho Escravo

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